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O Haiti permanece sob escombros

Em uma viagem recente, tive a oportunidade de passar alguns dias no Haiti. A dura realidade desse país me fez pensar muito sobre a desigualdade social e a triste situação que vivem milhões de pessoas ao redor do mundo. 

Caminhando por Porto Príncipe, capital do país, e me perguntava como era possível viver em uma situação tão extrema de pobreza. Quase três anos depois da tragédia do grande terremoto, pouca coisa parece ter mudado. A maioria das famílias atingidas ainda vive em acampamentos, alguns distantes do centro, próximos às montanhas que circundam a cidade, outros misturados aos escombros, que ainda perduram por toda a região.

Diante do Palácio do Governo, um lindo prédio com a fachada destruída, um haitiano que me acompanhava comentou que o prédio não foi reconstruído por interesse do governo, pois dessa maneira, os governantes continuam a garantir doações internacionais. O que está matando o Haiti agora, segundo ele, é a corrupção. 

Nos acampamentos não há água, energia ou banheiros. É impossível permanecer durante o dia dentro dos barracos de lona ou madeira, devido ao calor que faz na região. Assim, os moradores perambulam pelas ruas, ao léu, cobertos com algum pano ou sombrinha, para se protegerem do sol. 

Uma das imagens que mais me impactou foi a igreja onde faleceu nossa querida Zilda Arns; somente algumas paredes estão de pé. Zilda discursava no momento em que morreu e, segundo relatos, falava da importância de cuidar das crianças “como um bem sagrado”. Oxalá essa voz profética ainda possa ser ouvida, e que as crianças haitianas sejam de fato cuidadas e amparadas, para que possamos ver um dia o renascer de uma nação que permanece ainda sob os escombros.
 
Posteriormente, visitei a cidade de Hinche, 130km ao norte da capital, onde me hospedei na casa de uma família. Embora não tenha sido atingida pelo terremoto, a cidade também é assombrada pela miséria. No entanto, consegui enxergar nos olhos dos habitantes que ali vivem um profundo desejo de reconstruir o país. 

Na pracinha local, alguns meninos jogavam futebol e um deles vestia a camisa do Brasil. Como não falo crioulo, a língua local, disse para ele em português: “Você joga melhor que o Ronaldinho Gaúcho”. Ele sorriu, pegou a bola e a chutou para o gol. Em meu coração, eu repetia as palavras de Zilda Arns: “é preciso cuidar das crianças como um bem sagrado”. 

Naquele momento, o menino não marcou o gol, mas correu em direção a ele, jogou, tentou. Respirei aliviado, com a certeza de que ainda é possível ter esperança. 


Pe. Luis Erlin, cmf 

Artigo publicado originalmente no editorial da Revista Ave Maria, edição de setembro de 2012